terça-feira, 31 de março de 2015

Bioprospecção

Pesquisadores descobriram propriedade neurogênica no camapu.
Pesquisa é do Grupo de Pesquisas Bioprospecção de Moléculas Ativas.

  • Nas últimas décadas, a sociedade tomou consciência da importância econômica da biodiversidade e também da contribuição do conhecimento tradicional para a ciência.
Percebe-se que tanto nos meios científico, governamental, empresarial e popular ocorreu uma proliferação de informações e de pesquisas sobre o quanto os recursos naturais e os conhecimentos tradicionais podem ser úteis, seja na utilização de um recurso biológico para pesquisa agrícola, seja na sugestão pelos detentores do conhecimento tradicional de uma atividade farmacológica dos recursos da biodiversidade.
  • Essa consciência ficou mais nítida com o rápido processo de desenvolvimento da biotecnologia moderna, a partir dos anos 80, expandindo significativamente a capacidade humana de descobrir aplicações de interesses econômicos e sociais destes recursos, que passaram a ser vistos de forma diferente pela comunidade científica, pelos governos e pelas empresas. Estas mudanças de perspectiva do mercado vieram acompanhadas de preocupações sobre como partilhar os ganhos resultantes com tais atividades e sobre como minimizar os impactos ambientais da utilização destes recursos pela indústria.
  • Dentro desta ótica, a bioprospecção, a qual pode ser definida como a pesquisa da diversidade biológica à procura de potenciais valiosos contidos em recursos genéticos e bioquímicos de valor comercial que, eventualmente, pode fazer uso dos conhecimentos tradicionais, contribui para melhorar as capacidades nacionais, agregando valor aos recursos para que sejam utilizados de maneira sustentável. Ela gera uma oportunidade única de, ao mesmo tempo, conservar a biodiversidade e preservar a sociodiversidade, além de promover o desenvolvimento dos países detentores de tais recursos e auferir lucros e benefícios para todas as partes envolvidas no processo.
O Brasil, enquanto possuidor da maior diversidade de animais e de plantas do planeta (entre 15% e 20% do número total de espécies) ocupa papel de destaque no debate sobre os potenciais da bioprospecção. Alguns dos ecossistemas mais ricos em número de espécies vegetais – a Amazônia, a Mata Atlântica, o Pantanal e os Cerrados – estão aqui localizados. Também é considerado o país da sociodiversidade, com um conjunto muito rico de populações tradicionais, tais como indígenas, ribeirinhos, caiçaras, seringueiros, entre outros. São povos que utilizam tecnologia de baixo impacto e os seus conhecimentos têm sido utilizados como chave de acesso à própria diversidade.
  • Diversos estudos apontam que, além da riqueza natural e da sociodiversidade, o Brasil possui algumas vantagens, como infra-estrutura cientifica, disponibilidade de recursos humanos e universidades/instituições públicas de pesquisa com potencial para liderar as atividades de bioprospecção no país. Além disso, o Brasil também se constitui como um grande mercado para os produtos farmacêuticos e um importante participante no comércio agrícola mundial. Todas essas características fazem com que a posição brasileira em relação à bioprospecção seja decisiva para uma melhor convergência das posições dos principais players mundiais, como Estados Unidos, União Européia, Japão, Argentina, China e Índia.
Mas, apesar de todas estas vantagens, os resultados da bioprospecção no Brasil são muito modestos. O Brasil não conseguiu atender aos princípios básicos da CDB, que são a exploração destes recursos de forma soberana e sustentável. As principais dificuldades para a realização de bioprospecção no Brasil estão relacionadas à ausência de regras claras sobre os temas relevantes, tais como a repartição equitativa dos benefícios. Segundo Wilkinson (2002): “a falta de uma Lei de Acesso aos Recursos Genéticos por um lado paralisa o estabelecimento de relações contratuais entre empresas nacionais e internacionais e/ou o Estado para fins de bioprospecção e o intercâmbio de recursos biológicos do país e do exterior. Por outro lado, a ausência desta Lei deixa as portas abertas para casos de biopirataria".
  • A questão que se coloca no Brasil então é: qual a estratégia que o país deve adotar em relação à bioprospecção? Quais são as prioridades, dado que a bioprospecção pode ser feita de diversas formas e para vários fins, e qual modelo de regulamentação o país deve criar para potencializar a bioprospecção? Falta uma estratégia clara do país? Existem gargalos tecnológicos ou institucionais? Este trabalho, então, buscou analisar a relação destas duas questões – ambiente institucional e estratégia – levantando assim os possíveis obstáculos para desenvolvimento da bioprospecção no Brasil.
Assim, um dos objetivos principal deste trabalho foi identificar quais são os obstáculos para o desenvolvimento da bioprospecção no Brasil. Para tanto, foi feito um levantamento de quais são os desafios institucionais para este desenvolvimento, primeiro analisando casos de bioprospecção em outros países e no Brasil, em seguida fazendo uma análise do framework da bioprospecção no Brasil baseado na Economia Institucional.
  • Faremos a conceituação da bioprospecção e discutem-se quais as vantagens que o Brasil apresenta para o desenvolvimento destas práticas. O capítulo trata também da importância dos acordos internacionais relacionados ao tema e de qual a participação do Brasil nestas negociações internacionais.
Apresentamos a importância do desenvolvimento da biotecnologia para as práticas de bioprospecção (um ramo da biotecnologia) no país, criando novas possibilidades de conservação e de uso sustentável dos recursos ambientais.São apresentadas as variedades de atividades econômicas da bioprospecção, dando foco à indústria farmacêutica, que é o setor no qual se concentra o maior número de agentes interessados na realização da bioprospecção e por ser o maior usuário de recursos genéticos, sendo visto como de relação direta com o uso sustentável da biodiversidade e da repartição justa e equitativa de benefícios. Assim, apresentando o “paradoxo” das potencialidades do Brasil para o desenvolvimento da bioprospecção farmacêutica sem que haja nenhum medicamento genuinamente brasileiro.
  • Serão apresentados, respectivamente, a Economia Institucional aplicada à bioprospecção no Brasil e os estudos de casos nacionais e internacionais de bioprospecção. Portanto, com vistas a responder a questão-problema - obstáculos para a bioprospecção, as variáveis levantadas no desenho do framework da bioprospecção no Brasil, baseadas na Economia Institucional, bem como as dificuldades e os desafios encontrados nos estudos de casos deram base para construção de um quadro que faz o paralelo entre as variáveis encontradas nos cases e no framework da economia institucional.
É feita a análise de uma pesquisa realizada com agentes ligados às atividades de bioprospecção. Para tanto, foi feito um levantamento de opiniões através de envio eletrônico de questionários para diversos agentes envolvidos em questões de bioprospecção e de diversas áreas ambientais, tais como acadêmicos, pesquisadores do setor privado e público, representantes de ONG’s e alguns representantes de empresas do setor privado que fazem pesquisa com bioprospecção.

Conceituação da bioprospecção:
  • A prática de recolher, de analisar e de comercializar material biológico é tão antiga quanto à civilização humana. Há milhares de anos a humanidade busca novas formas de melhorar a produção de alimentos, o combate às doenças e outros males, e fazer outras descobertas que podem melhorar a qualidade de vida no planeta. Portanto, novas variedades de cultivares, de medicamentos e de outros produtos são resultados de uma longa história de comercialização e de intercâmbio de recursos genéticos e biológicos, conjuntamente com a utilização dos conhecimentos tradicionais associados. 
Os recentes avanços da biotecnologia e das ciências afins levaram à intensificação da exploração econômica dos recursos da biodiversidade. Esta prática antiga de buscar na natureza recursos genéticos e bioquímicos para o desenvolvimento de produtos é descrita agora por um novo termo: “bioprospecção ou prospecção da biodiversidade” (LAIRD, 2007; SCOTT, 2001).
  • A bioprospecção pode ser definida como a exploração da biodiversidade a fim de se extraírem recursos genéticos e bioquímicos de valor econômico e social (BEATTIE, 2005), que pode fazer uso do conhecimento de indígenas e/ou tradicionais (SANT’ANA, 2002), aplicando tecnologias avançadas para desenvolver novos produtos farmacêuticos, agroquímicos, cosméticos, fragrâncias, enzimas industriais, entre outros. (ARTUSO, 2002).
Assim, Reid et al. (1993) afirmam que para os governos dos países ricos em biodiversidade criam-se possibilidades de ganhos a serem obtidos com a extração dessa riqueza natural. O que gera uma oportunidade única de, ao mesmo tempo, conservar a biodiversidade, promover o desenvolvimento dos países detentores de tais recursos e auferir lucros mais altos para a indústria.
  • Para tanto, quatro elementos se fundamentam para as atividades de bioprospecção: as políticas macro, os levantamentos da diversidade biológica e os sistemas de gestão de informação, as transferências de tecnologia e o desenvolvimento de negócios com um plano estratégico (QUEZADA et al., 2005). A bioprospecção torna-se um elemento fundamental para as indústrias reconhecerem o valor econômico da biodiversidade. Neste sentido, a bioprospecção pode ser aplicada em diversas atividades, causando impactos em diversos setores da economia, com destaque para o setor farmacêutico, cosméticos, alimento e bebida e insumo agrícola.
No entanto, as atividades de bioprospecção são complexas, multidisciplinares, com um elevado grau de incerteza e que envolvem uma grande quantidade de agentes. São atividades que demandam condições muito especiais para prosperar, como infra-estrutura científica e tecnológica e um ambiente institucional que tem por objetivo a redução das incertezas e dos custos de transação entre os agentes.
Para que a bioprospecção tenha credibilidade científica, política e econômica deve-se observar os seguintes princípios: I) princípio da prevenção – na dúvida quanto a danos irreversíveis não se deve iniciar ou prosseguir com a atividade; II) princípio da preservação dos recursos – para não haver esgotamento dos recursos; III) princípio da equidade distributiva – os benefícios devem ser partilhados entre todas as partes envolvidas na atividade; IV) princípio da participação pública – garantia da participação mais ampla da população envolvida através de entidades públicas ou particulares e mesmo o cidadão isoladamente; V) princípio da publicidade – todos os atos da atividade devem ser transparentes e com caráter público, por se tratarem os recursos naturais de um bem de uso comum, ou seja, bem de todos da nação; VI) princípio do controle público e privado – o processo deve ser controlado pelos órgãos de fiscalização, bem como pelas entidades não governamentais; e VII) princípio da compensação – no qual, a comunidade ou a pessoa fornecedora de matéria-prima ou do conhecimento deve receber compensações monetárias e/ou não-monetárias (SANTOS, 2008).
  • Entretanto, a bioprospecção está inserida, historicamente, no conflito entre os interesses dos países desenvolvidos, porém pobres em biodiversidade, do Hemisfério Norte, que buscam explorar a rica biodiversidade dos países pobres, porém ricos em biodiversidade, do Hemisfério Sul, principalmente países tropicais. Neste contexto,  disputa histórica pelo acesso, pelo controle e pelo uso dos recursos da biodiversidade, por séculos esteve fortemente associada com o nível de desenvolvimento ou de subdesenvolvimento científico e tecnológico dos países envolvidos. Nos debates atuais entre Norte e Sul, os atores e as estratégias envolvidas para transformarem os ativos da biodiversidade em produtos pela biotecnologia moderna seguem a mesma lógica, porém, os conflitos agora são entre os interesses comerciais dos países desenvolvidos e os interesses de preservação e de uso sustentável dos países em desenvolvimento - os grandes detentores da biodiversidade (REID, 1996 apud SANT’ANA, 2002).
Até os anos 80 do século XX, as utilizações dos recursos da biodiversidade para as atividades de bioprospecção não eram questionadas. O entendimento global considerava estes recursos genéticos como patrimônio da humanidade, portanto, de livre acesso. Os países provedores de biodiversidade não impunham muitas restrições às pesquisas conduzidas pelas empresas ou pelos institutos estrangeiros. Os países que faziam uso da biodiversidade coletavam e extraíam plantas, pequenos animais e micro-organismos que poderiam ser usados nos seus programas de desenvolvimento tecnológico e industrial. Os países provedores destes recursos pouco participavam deste processo, às vezes, os pesquisadores locais eram convidados a participar de projetos, mas as funções destes se restringiam em muitos casos apenas como guia para coleta de amostras em campo, e quando estas pesquisas geravam benefícios, estes eram pouco ou nada compartilhados, ficando os lucros para os desenvolvedores (PAVARINI, 2000).
  • No final dos anos 80, há uma mudança de paradigma referente à soberania sobre os recursos genéticos. O princípio aceito até então pela maioria dos países, de que “os recursos genéticos deveriam estar disponíveis para todo e qualquer propósito, já que os produtos finais beneficiariam todas as sociedades” (CAILLAUX & MÜLLER, 1998 apud AZEVEDO, 2003), começou a ser alterado em virtude do “crescimento das indústrias de biotecnologia e da apropriação destes recursos, por meio do patenteamento de processos ou de produtos desenvolvidos a partir da biodiversidade”. Por isso, os países detentores destes recursos passaram a valorizar mais a sua biodiversidade, principalmente a diversidade genética, mudando de atitude com relação ao controle do seu acesso (AZEVEDO, 2003).
No início dos anos 90 “ressurgiu o debate sobre a importância dos recursos da biodiversidade, porém desta vez como fonte de bioprospecção”. O uso dos recursos da biodiversidade agora estaria baseado em um novo paradigma, alicerçado em três grandes áreas: da informação, da ciência e da tecnologia, com aplicação no processo produtivo das empresas (LASMAR, 2005). Para tanto, surgiu a necessidade de um regime internacional que promovesse a distribuição justa e equitativa dos ganhos advindos da biodiversidade e que ao mesmo tempo adotasse uma visão sistêmica sobre a conversação destes recursos (ENRÍQUEZ, 2005). Assim, o consenso geral foi que o ideal seria o estabelecimento de um novo tratado internacional, ao invés de uma Convenção “guarda-chuva”, que agrupasse todas as Convenções Internacionais sobre o assunto existentes. Para a formação de um entendimento mais uniforme sobre o tema, foi realizada, em 1992, na cidade do Rio de Janeiro, a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB).
  • Com a Convenção, novos atores passaram a fazer parte dos estudos e dos debates sobre as diversas manifestações da biodiversidade. A prática da bioprospecção no campo do desenvolvimento científico-tecnológico é a que mais evidencia uma miríade de tantos atores, de relações e de disputas de todos os tipos, por ser uma atividade multidimensional (uma prática coletiva condicionada por outras práticas sociais), envolvendo atores de todos os tipos, como cientistas e não cientistas, políticos, acadêmicos, industriais, tecnólogos, representantes das comunidades indígenas, o Estado, entidades não governamentais (ONGs) e vários outros grupos de interesses (TRIGUEIRO, 2006 apud DIAS & COSTA, 2008).
A partir da CDB, começa a ser construída uma nova relação entre os atores que utilizam os recursos da biodiversidade e os da conservação. Desta forma, para entender melhor quais são os grupos de atores mais ativos nas práticas de bioprospecção, a autora Polski (2005) os divide em:
  • Criadores de conhecimento – os que na maioria das vezes possuem um conhecimento prévio para bioprospecção (Pajés ou Xamãs, acadêmicos, cientístas e as comunidades do conhecimento tradicional – quilombolas, ribeirinhos, pescadores etc.), no processo de bioprospecção, eles podem criar novos conhecimentos, produtos, processos ou aplicações, e/ou criar produtos rentáveis;
  • Empreendedores – os que bioprospectam os recursos biológicos dentro ou fora do país, no qual os seus empreendimentos estão instalados (empresários, agricultores, vendedores, biotecnologistas etc.), que têm por como objetivo desenvolver novos produtos, processos e aplicações rentáveis, podendo trazer avanço aos conhecimentos;
  • Colecionadores – são os que colhem amostras para expandir a sua própria coleção ou para vender a outros.
No entanto, apesar dos bioprospectores desenvolverem atividades distintas, os seus objetivos, muitas vezes, são sobrepostos. Para os colecionadores, suas atividades têm dimensões econômicas relativamente estáticas (baseada na colheita e no uso imediato). Já os criadores de conhecimento e os empresários têm como objetivos descobrir e transmitir o valor dos recursos biológicos que eles colheram, dependendo do propósito empregado, o que pode agregar valor a estes recursos no processo de bioprospecção e/ou transformar estes recursos em um novo tipo de ativo,
  • Além dos bioprospectores acima citados, um ator muito importante nas práticas de bioprospecção é o Estado-Nacional, que é o detentor de muitas áreas protegidas e o provedor direto de recursos genéticos em condição in situ, que tem um papel fundamental nas pesquisas e no desenvolvimento em muitos países, além de ser o responsável pelo estabelecimento de políticas e de execução de leis que implementem a CDB (AZEVEDO, 2004).
Entende-se que a bioprospecção deve ser uma prática em que todos os atores envolvidos obtenham ganhos, monetários ou não-monetários, possibilitando a conservação e o uso sustentável dos recursos da biodiversidade. Neste sentido, a bioprospecção deve atender os objetivos determinados pela CDB, quais sejam: I) a conservação da biodiversidade; II) a utilização sustentável de seus componentes; e III) a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos da biodiversidade. No entanto, muitos atores ainda têm pouco conhecimento sobre a CDB, acarretando em muitos casos a falta de critérios de justiça e de equidade na partilha dos benefícios.
  • A prática da bioprospecção, por ser muito complexa e sujeita a elevados riscos tecnológicos e econômicos, necessita de que seja estabelecido de regras ou de instituições muito específicas, para que possa se desenvolver. Também é importante e necessário que o poder público, as organizações não governamentais (ONGs), as universidades públicas e particulares, as empresas químicas, farmacêuticas e entre outras, além das comunidades participem concretamente através de convênios, de contratos de concessão, de permissão e de parcerias em geral, com programas que tenham regras bem definidas, nos quais as partes assumam responsabilidades claras, pois a boa regulamentação da bioprospecção contribui para a conservação dos recursos naturais, para o desenvolvimento econômico dos países envolvidos no processo e para o desenvolvimento social através de partilhas de benefícios monetários e não monetários com as parcerias.
Todavia, apenas alguns países em desenvolvimento possuem condições para explorar suas riquezas naturais de forma adequada, aproveitando as oportunidades criadas pela bioprospecção. Segundo Silveira et al. (2004), dentro deste seleto grupo, o Brasil possui condições para liderar atividades de bioprospecção no mundo, pois possui boa infraestrutura científica e tecnológica, disponibilidade de recursos humanos e universidades e instituições públicas de pesquisa no campo das ciências da vida. O próximo item aborda a bioprospecção no Brasil, visando a caracterizar os avanços conseguidos no país e seus principais instrumentos de gestão desta área.
  • Considera-se este item importante para o mapeamento dos entraves e dos avanços que o país obteve dentro de um contexto mundial de operacionalização da bioprospecção de forma eficiente e justa para as comunidades envolvidas.

Extratos de plantas de pesquisa com micropropagação e bioprospecção

Bioprospecção no Brasil:
  • O Brasil abriga a maior diversidade de animais e de plantas do mundo, possui entre 15% e 20% do número total de espécies, conta com a mais diversa flora do planeta, número este superior a 55 mil espécies descritas, cerca de 22% do total mundial, estimado em 270 mil espécies. Alguns dos ecossistemas mais ricos do planeta em número de espécies vegetais – a Amazônia, a Mata Atlântica e os Cerrados – estão aqui localizados.
Esse banco genético de milhares de espécies tem valor estratégico para o desenvolvimento do país no presente século e seu valor estimado é de pelo menos US$ 2 trilhões, segundo estimativa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). O Brasil deixa de ganhar US$ 250 bilhões por ano ao não explorar sua biodiversidade e este cálculo está baseado na experiência de empresas de bioprospecção no Brasil, de acordo com Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA).
  • O Brasil é considerado também o país da sociodiversidade. Contando no seu território com um conjunto muito rico de populações tradicionais, como comunidades indígenas, ribeirinhos, caiçaras, sertanejos, seringueiros e quilombolas. São aproximadamente 206 culturas indígenas que falam 160 línguas. Esses povos utilizam tecnologias de baixo impacto, como o extrativismo, a pesca e a lavoura. Os conhecimentos desses povos são verdadeiros legados das gerações passadas que têm sido utilizados como chave de acesso à própria diversidade, principalmente pela agroindústria e pelas indústrias farmacêuticas e alimentícias (CARNEIRO, 2007).
Portanto, para aproveitar todo este potencial em razão das inúmeras possibilidades de utilização da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais para a bioprospecção, é necessidade sine qua non para o Brasil ter uma estratégia para o uso sustentável destes recursos. Para tanto, é fundamental que as instituições públicas, as Universidades, as ONG’s, as associações de grupos do conhecimento tradicional, as empresas privadas nacionais e multinacionais e a coletividade em geral participem do processo de elaboração desta estratégia, para que a bioprospecção seja feita a partir das necessidades e prioridades do país.
  • Para tanto, o Brasil tem participado ativamente nas negociações internacionais e estado presente nos mais diversos fóruns internacionais que tratam a matéria. No âmbito internacional, o Brasil foi um dos primeiros países signatários da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB). Para atender às exigências da CDB, foram feitas modificações na legislação, como a Medida Provisória nº 2.186-16 de 2001 e o Decreto nº 3.945 de 2001, modificado pelo Decreto no. 4.946 de 2003, que criou o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético – CGEN (ASSAD & SAMPAIO, 2005).
Entretanto, paradoxalmente, os resultados da bioprospecção no Brasil são muito modestos. O Brasil não conseguiu atender aos princípios básicos da CDB, que é a exploração de forma soberana e sustentável dos recursos da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais a ela associados. As dificuldades para a realização de bioprospecção no Brasil estão relacionadas à ausência de regras claras sobre os temas relevantes, tais como a repartição equitativa dos benefícios. Segundo Wilkinson (2002), “a falta de uma Lei de Acesso aos Recursos Genéticos por um lado paralisa o estabelecimento de relações contratuais entre empresas nacionais e internacionais e/ou o Estado para fins de bioprospecção e o intercâmbio de recursos biológicos do país e o exterior. Por outro lado, a ausência desta Lei deixa as portas abertas para casos de biopirataria". patrimônio genético, por meio de Decretos, Resoluções, 
  • Deliberações e Orientações Técnicas, estes três últimos aprovados pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA). Portanto, o CGEN é o órgão responsável por autorizar/deliberar toda e qualquer atividade de acesso, de remessa, de uso, de desenvolvimento, de bioprospecção, de desenvolvimento tecnológico que venha a utilizar qualquer recurso genético existente e de origem nacional (ASSAD & SAMPAIO, 2005).
Salientando que a ausência de um marco regulatório pode ter efeitos negativos sobre as atividades de bioprospecção. Primeiro, a bioprospecção poderá ser realizada de forma ilegal, sem a fiscalização das agências responsáveis e, portanto, ela será realizada sem nenhum compromisso de atender aos princípios da CDB. Segundo, as incertezas criadas pela ausência de um marco regulatório inviabilizam investimentos na área, que no longo prazo poderá comprometer o desenvolvimento de capacidade científica e tecnológica no país.
  • Por outro lado, se o Brasil conseguir transpor os obstáculos institucionais e criar um “modelo institucional” de regulamentação que possa estimular a bioprospecção por vias legais e, ao mesmo tempo, atender aos requisitos dos acordos multilaterais, conciliando os interesses dos agentes envolvidos no processo, o desenho institucional brasileiro poderá servir de modelo para países com características e interesses semelhantes.
Daí a importância do Brasil no processo de um “desenho institucional” para a bioprospecção no cenário internacional, além da megadiversidade e da rica sociodiversidade, o país avança nas pesquisas em biotecnologia, o que é extremamente relevante para os propósitos da bioprospecção. No entanto, é necessário estabelecer prioridades para viabilizar as reais potencialidades da bioprospecção no país. Além da relevância de ações governamentais para criar um sistema regulatório claro e que atenda aos objetivos da CDB de forma objetiva e menos burocrática e que evite a prática da biopirataria, é necessário também que sejam realizadas ações concretas para incrementar o processo de bioprospecção, tais como:
  • Realização de inventário – realizar o inventário da biodiversidade que forneça subsídios para conhecer o seu potencial;
  • Educação Ambiental – conscientização sobre a importância da biodiversidade para que seja preservada;
  • Fomento à pesquisa – a bioprospecção cria um leque de opções, sendo necessário definir prioridades de investimento;
  • Divulgação – publicação dos atos do processo de bioprospecção; 
  • Mecanismos de garantia de partilha de benefícios – entre os participantes do processo de bioprospecção, garantindo os direitos de propriedade intelectual;
  • Mecanismos de incentivo - desenvolvimento de mecanismos de incentivo ao desenvolvimento de relações formais e informais entre os atores do processo (SANT’ANA, 2002; BENTES-GAMA, 2008).
Porém, se estes “gargalos” começam a ser solucionados e um novo quadro institucional desenhado atenda às necessidades do país, assim como os interesses divergentes dos agentes da bioprospecção, o Brasil pode ser beneficiado com o desenvolvimento de muitas atividades da bioprospecção, que ainda não são muito exploradas, como a produção de fitoterápicos. Estes medicamentos movimentam cerca de US$ 60 bilhões por ano no mundo e somente um valor aproximado de US$ 450 mil no Brasil. No entanto, em muitos países, o consumo deste tipo de medicamento já rivaliza com os medicamentos convencionais, como na França e na Alemanha (LASMAR, 2005).
  • Contudo, para potencializar a pesquisa, o desenvolvimento, a produção e a comercialização da bioprospecção, tanto nas áreas da saúde e da agricultura, o Brasil conta com importantes instituições-chave, tais como a Embrapa, a Fiocruz, o Instituto Butantã, entre outros. Para estas instituições, as parcerias e os acordos de cooperação com empresas privadas e institutos de pesquisa de outros países são fundamentais para o progresso da pesquisa e da produção da biotecnologia no país. No Brasil, como em todo mundo, o setor público é o grande investidor em biotecnologia. Mas uma das grandes dificuldades destas instituições é o marco regulatório referente à propriedade intelectual. A indefinição do quadro atual dificulta a apropriação das inovações das instituições-chave brasileiras (SILVEIRA et al., 2001).
Dentro deste contexto, o Brasil, por ser signatário de dois acordos internacionais importantes que tratam do assunto, mas que apresenta divergências em alguns pontos, o acordo TRIPS (Tratado sobre os Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio) e a CDB (Convenção sobre Diversidade Biológica), deve ter por objetivo buscar um caminho para prática da bioprospecção, que beneficie todos os atores envolvidos, sem contrapor os princípios desses dois acordos.

Em 2010, o Instituto Estadual de Florestas (IEF), por meio da Gerência de Proteção à Fauna, Flora e Bioprospecção / Diretoria de Biodiversidade concentrou esforços no desenvolvimento de pesquisas em biologia, ecologia, taxonomia (ciência que classifica os seres vivos) e distribuição.



segunda-feira, 30 de março de 2015

Energia, Meio Ambiente e Economia

Economia sempre é um assunto que rende muitas dicas e conselhos, mas 
principalmente  quando se trata de energia elétrica, que é um assunto 
técnico e complexo. 

  • O panorama mundial está mudando rapidamente, por motivos ligados a três das grandes preocupações da humanidade nesse início de século: meio ambiente, energia e economia global. Embora à primeira vista possam parecer distintas, estas três áreas estão, na realidade, completamente interligadas. As duas primeiras estão já há mais tempo na percepção do cidadão comum, devido ao efeito estufa e ao aquecimento global associado ao uso de combustíveis fósseis. Quanto à economia, só o tempo dirá quais os efeitos permanentes que esta crise no sistema financeiro internacional terá sobre o setor energético e, mais difícil de se prever, sobre o meio ambiente. A única coisa certeza é de que os três setores serão permanentemente afetados.
O sistema financeiro não pode ser ignorado. Para se ter uma idéia, o presidente George Bush anunciou em 2006, com grande pompa, um aporte de 1 bilhão de dólares para pesquisas em fontes alternativas de energia, com ênfase no hidrogênio. Estima-se que a crise do sistema financeiro vá consumir algo em torno de 3 trilhões de dólares. A guerra no Iraque já custou aos cofres estadunidenses um valor superior a 500 bilhões de dólares.
  • Não importa qual a saída adotada, ela necessariamente terá que passar por uma mudança radical na matriz energética mundial, com forte aumento da participação das fontes renováveis.
Neste contexto, o Brasil se destaca dos demais países por um motivo bem simples: a matriz brasileira já é cerca de 46% renovável, comparada à média mundial de 12%.
  • O Brasil tem, portanto, uma oportunidade ímpar de se firmar como um dos líderes mundiais no setor de energia. Impulsionado por seu gigantesco potencial hídrico e contando com um forte programa de combustíveis alternativos capitaneado pelo etanol, o país sai na frente dos demais. Por outro lado, não podemos desprezar as novas reservas de petróleo recentemente descobertas no litoral brasileiro. Mas, para se manter na frente, serão necessários recursos, muitos recursos: manutenção dos sistemas atuais, modernização dos sistemas e, principalmente, pesquisa e desenvolvimento são algumas das prioridades.
É difícil que o setor público consiga arcar sozinho com estas despesas e uma interação com o setor privado se torna cada vez mais necessária e fundamental. Até a crise no sistema financeiro, o setor energético contava com forte capacidade de investimento em pesquisa e desenvolvimento, e o setor acadêmico, com boa parte dos cérebros. O casamento não só seria natural, como desejável.
  • Esta contribuição pretende, de forma sucinta, resumir o panorama mundial, contextualizar o Brasil neste panorama e avaliar quais seriam as alternativas mais adequadas a este contexto. Quanto às fontes renováveis de energia, dedicaremos nossa atenção às alternativas já implementadas em maior escala: energia hidráulica, biomassa, energias solar e eólica. As fontes alternativas que ainda se encontram em fase de desenvolvimento, ou que ainda têm aplicação em escala menor (hidrogênio e células a combustível, por exemplo), não serão abordadas aqui.
Algumas questões serão levantadas: como está o setor energético no Brasil? Quais são as fontes renováveis propostas? Quais os efeitos da crise do sistema financeiro sobre o setor energético? Qual é o papel dos químicos neste panorama? Não iremos detalhar os processos de obtenção de energia, mas sim dar uma idéia, principalmente aos graduandos e pós-graduandos, além do público leigo em geral, dos desafios que esperam aqueles que decidirem se aventurar nesta área extremamente complexa e igualmente fascinante.

A importância dos químicos na questão energética:
  • Para os químicos, o cenário que se desenha para um futuro a curto, médio e longo prazo é o de um significativo aumento de participação, seja no desenvolvimento de novas técnicas e processos, seja no processo decisório.
Duas das áreas de maior desenvolvimento na química atual são a Química Verde (também conhecida como Química Sustentável) e a Química Ambiental, ambas de importância fundamental na transição para uma matriz energética mais renovável e menos poluidora.
Resumidamente, a Química Verde surgiu no início da década de 1990, quando a Agência Ambiental Estadunidense US-EPA (United States Environmental Protection Agency) lançou o programa “Rotas
  • Sintéticas Alternativas para Prevenção de Poluição”, que foi seguido em 1995 pela instituição da premiação The Presidential Green Chemistry Challenge. Um histórico do nascimento da Química Verde, bem como um detalhamento de seus princípios, pode ser encontrado no interessante artigo de Lenardão e colaboradores, além do site da US-EPA na internet.
De maneira bastante resumida, a Química Verde consiste de produtos e processos químicos projetados de modo a reduzir ou eliminar impactos ambientais negativos. O uso e a produção destes produtos devem envolver a redução da geração de resíduos, o uso de componentes atóxicos e um aumento na eficiência global. A abordagem é bastante efetiva, pois aplica soluções científicas inovadoras a situações reais. Os 12 Princípios da Química Verde, originalmente descritos por Anastas e Warner, servem como parâmetro de sua implementação pelos químicos. Estes 12 princípios são: 1. prevenção - projetar as sínteses de modo a evitar a geração de resíduos, que depois deverão ser tratados; uso de reagentes menos tóxicos - projetar o uso de produtos químicos totalmente efetivos, embora com baixa ou nenhuma toxicidade; sínteses menos nocivas - projetar sínteses de modo a utilizar e gerar substâncias com baixa ou nenhuma toxicidade para os humanos e o meio ambiente; uso de matéria-prima renovável - usar materiais brutos e matérias-primas renováveis, em vez de esgotar recursos. A matéria-prima renovável muitas vezes envolve o uso de produtos agrícolas ou resíduos de outros processos; a matéria prima não-renovável vem de combustíveis fósseis ou da mineração;  uso de catalisadores e não reagentes estequiométricos - minimizar os resíduos através do uso de catalisadores, que são usados em quantidades mínimas, podendo ser reutilizados muitas vezes. São preferíveis a reações estequiométricas, onde há frequentemente excesso de reagentes e geração de resíduos;  evitar o uso de derivados - evitar o uso de grupos protetores ou bloqueadores ou, ainda, quaisquer modificações temporárias, quando possível. Os derivados requerem reagentes adicionais e geram resíduos; economia de átomos - projetar as sínteses de forma que o produto final contenha a maior proporção possível dos materiais de partida. Deve haver poucos ou nenhum átomo desperdiçado; uso de solventes e condições de reação mais seguros - evitar o uso de solventes, agentes de separação ou outros produtos químicos auxiliares. Caso seja necessário, use produtos inócuos; aumentar a eficiência energética - realizar as reações químicas em temperatura e pressão ambientes sempre que possível;  projetar reagentes e produtos degradáveis após o uso - projetar os produtos químicos de modo que possam ser degradados em substâncias inócuas após seu uso, de modo a não haver acúmulo no meio ambiente;  análise em tempo real para evitar a poluição - incluir o monitoramento dos processos em tempo real, dentro do processo, para evitar ou eliminar a formação de produtos secundários nocivos; . minimizar o potencial de acidentes - projetar os produtos e suas formas (sólido, líquido ou gás) de modo a minimizar o potencial de acidentes químicos, incluindo explosões, incêndios ou derramamentos no meio ambiente.
  • Neste contexto, podemos imaginar alguns pontos adicionais mais relacionados à questão energética, onde a participação de químicos e bioquímicos será de importância fundamental: a) projeto e criação de vegetais que tenham maior eficiência fotossintética (por exemplo, microalgas) e sua introdução na matriz energética; b) projeto e criação de vegetais mais resistentes a pragas ; c) desenvolvimento de defensivos agrícolas biodegradáveis; d) desenvolvimento de tecnologias nacionais avançadas para biorrefinarias; e) melhoria na eficiência de bioprocessos; f) introdução de novos catalisadores, de preferência biocatalisadores, que não dependam do uso de metais pesados e de alto custo; g) avanço na tecnologia de produção e armazenamento de hidrogênio, seja pela eletrólise, seja pelo uso da luz solar; h) investimento no potencial da biodiversidade brasileira, mais especificamente a oleoquímica e a etanol-química, visando atingir uma matriz mais rentável do que simplesmente a substituição de combustíveis fósseis por biocombustíveis.
Até aqui já citamos algumas vezes a matriz energética. Mas o que seria isso?

Matriz energética:
  • A matriz energética consiste, numa definição simplificada, de uma descrição de toda a produção e consumo de energia de um país, discriminada por fonte de produção e setores de consumo. A matriz pode ser tão detalhada quanto se deseje. No Brasil, a descrição disponível mais detalhada que se tem é o Balanço Energético Nacional (BEN), que é elaborado anualmente pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), sendo publicado pelo Ministério da Minas e Energia (MME). É um documento bastante completo, publicado regularmente desde 1970, sendo amplamente utilizado tanto pelo governo quanto pelo setor privado para suas atividades de planejamento e investimento.
A elaboração de um balanço energético é uma atividade bastante complexa, que exige um alto grau de cooperação por parte dos agentes participantes (governos, empresas e agentes informantes). Como exemplo, tomemos uma fábrica de suco de laranja que produz 800 L de suco por dia. Na fábrica, queima-se óleo combustível numa caldeira e o vapor resultante é utilizado no processo industrial. O processo também utiliza energia elétrica. Tanto o óleo combustível como a eletricidade são adquiridos de empresas distribuidoras. Vamos supor que o consumo diário da caldeira seja de 4200 kJ de energia na forma de óleo combustível e 840 kJ de eletricidade. O balanço energético do processo nos dirá que, em termos de consumo final, se gastam 5040 kJ de energia. Quanto ao consumo específico, temos 4200+840/800 = 6,3 kJ/L de suco. No BEN, este consumo é classificado como consumo final no setor de alimentos.
  • O exemplo acima é extremamente simplificado, mas mostra que a confiabilidade do balanço depende dos valores informados tanto pela fábrica quanto pelas companhias distribuidoras. Se imaginarmos que cálculos semelhantes devem ser feitos para todos os processos que consomem energia no país, podemos ter uma idéia do grau de complexidade que a tarefa pode atingir.
Ainda em relação a este exemplo, destacamos que o balanço considera apenas o consumo energético dentro da fábrica. O gasto de energia para o transporte da matéria-prima (no caso, as laranjas e o próprio óleo combustível) até a fábrica e para o transporte do produto resultante até o consumidor final não é incluído nesta fase do balanço, pois irá aparecer em outra fase, a dos gastos de energia com transporte.

A matriz energética brasileira:
  • Para se ter uma idéia da complexidade que a matriz energética pode atingir, basta que se observe que a matriz energética brasileira de 2007 pode ser resumida em uma planilha de 57 colunas e 185 linhas!
Define-se a matriz energética como sendo a oferta interna de energia (OIE) discriminada quanto às fontes e setores de consumo. A OIE é, às vezes, chamada de demanda total de energia (DTE). As unidades mais usadas são caloria, joule e btu para o poder calorífico e kWh (quilowatt-hora) para eletricidade. Também é comum encontrarmos a tonelada equivalente de petróleo (tep), que nos dá a energia consumida em termos de uma massa equivalente de petróleo. Considera-se que 1 kg de petróleo equivale a 10.000 kcal, ou seja, aproximadamente 42.000 kJ. Quanto à eletricidade, é útil ter em mente que 1 kWh é a energia necessária para manter acesas 10 lâmpadas de 100 W durante 1 h o que, em termos de energia, equivale a 3,6 kJ.
  • A  oferta interna de energia no Brasil em 2007. O valor total foi de 238,8 milhões de tep, o que representa um aumento de 5,5% em relação a 2006, e que equivale a 2% de toda a energia produzida no mundo. Um dado interessante é a OIE per capita, que no Brasil foi de 1,29 tep/habitante. Este valor fica abaixo da média mundial (1,8 tep) e é cerca de 3,6 vezes menor que a média dos países da OECD (Organisation for Economic Cooperation and Development – Organização Para Cooperação Econômica e Desenvolvimento), constituída majoritariamente por países ricos. Devemos ressaltar que um fator que contribui significativamente para este baixo consumo per capita no Brasil e a inexistência de sistemas de calefação na quase totalidade das residências no país. Entretanto, esta tendência vem sendo compensada de forma crescente pela instalação cada vez mais comum de sistemas de refrigeração em residências e no setor comercial.
Com relação ao crescimento da economia, que foi de 5,4% em 2007, pode-se considerar que não houve expansão significativa da oferta de energia. O forte crescimento da economia (e, portanto, da demanda de energia) em 2007 foi puxado por setores exportadores, especialmente aqueles que consomem mais energia como, por exemplo, os de metalurgia, papel e celulose e sucroalcooleiro. Soma-se a isto um forte crescimento do setor interno de bens e serviços. Uma boa noticia é que o aumento da demanda se deu, principalmente, com um maior crescimento do uso de fontes renováveis (+ 7,6%) em relação às fontes não renováveis (petróleo e derivados, gás natural, carvão mineral e urânio, crescimento de 3,7%). Assim, a energia renovável atingiu 45,9% da matriz brasileira em 2007, colocando o país numa posição invejável e única entre os países de maior consumo no mundo.
Na matriz de 2007, destaca-se o etanol, cuja produção teve um crescimento de 27% em relação a 2006, atingindo um total de 389 mil barris/dia. O consumo também teve expressivo crescimento (29%). De fato, em 2007 os derivados de cana ultrapassaram pela primeira vez na história a energia hidráulica e a eletricidade na oferta interna de energia no país.
  • Outro dado interessante foi a participação do bagaço de cana, que é utilizado como fonte térmica principalmente nos setores energético (nas próprias destilarias) e na indústria de alimentos. O crescimento do consumo de bagaço foi de 11% em 2007.
Dois fatores principais são apontados pelos especialistas para explicar o forte crescimento dos derivados de cana na OIE: a entrada em operação de unidades industriais mais modernas e eficientes e o aprimoramento das variedades de cana, com maior teor de açúcar.

Oferta de energia no mundo:
  • A  oferta de energia no mundo, discriminada por setores.  temos uma comparação entre o Brasil, os países da OECD e o resto do planeta. Nota-se um grande contraste entre as participações da biomassa e da energia hidráulica entre o Brasil e os demais países. Enquanto o Brasil tem 31,1% de participação da biomassa e 14,9% de participação da energia hidráulica, no mundo estes valores caem para 10,5 e 2,2%, respectivamente.
Estes dados mostram a posição única que o Brasil ocupa no mundo. O país está, para as fontes renováveis, como a Arábia Saudita, por exemplo, está para o petróleo.

Reservas e recursos:
  • Quanto às reservas finitas e recursos, o Conselho Mundial de Energia (World Energy Council) recomenda que se faça uma distinção entre recursos localizados e recursos recuperáveis, e entre recursos comprovados e recursos adicionais (ou seja, não comprovados). Outras agências e entidades governamentais podem utilizar outras definições. Passamos a seguir a descrever resumidamente a situação atual das principais fontes de energia no mundo.
Recursos não-renováveis
Carvão:
  • O carvão mineral foi o primeiro combustível fóssil a ser usado em larga escala e ainda ocupa uma posição de destaque no cenário mundial. Na verdade, trata-se da fonte de energia com maior crescimento nos últimos anos.
Embora seja tradicionalmente considerado um “combustível sujo”, devido às emissões de gases, novas técnicas de utilização “limpa” do carvão vêm fazendo com que esta fonte seja considerada uma matriz energética mais limpa: entre estas técnicas, podemos citar a conversão de carvão em combustíveis líquidos, o uso de ciclos integrados de gaseificação combinada (IGCC) e a recuperação e utilização de metano das minas de carvão, além das técnicas de captura e armazenamento de carbono.
  • A utilização de carvão no Brasil é praticamente restrita aos processos industriais, com grande predomínio do setor siderúrgico. Este processo exige a utilização de carvão de grau metalúrgico, que é importado em sua totalidade. Na geração de eletricidade, utiliza-se o chamado carvão vapor, produzido no país. Em 2007, verificou-se uma forte expansão da produção de aço, que resultou em um crescimento de 10% na importação de carvão metalúrgico. O uso do carvão na produção de eletricidade teve queda de 7,7% em relação a 2006.
A  evolução da utilização do carvão mineral no Brasil, em três momentos distintos: 1973, 1986 e 2007. Dois fatores chamam a atenção: o crescimento do uso pelo setor siderúrgico e a redução em uma ordem de grandeza das perdas, devido, principalmente, à introdução de caldeiras mais modernas. Nota-se também que o setor de cimento, que não utilizava carvão em 1973 e teve forte crescimento até 1986, está deixando de usar esta fonte em favor do gás natural.

Gás natural:
  • Desde 1980, as reservas comprovadas de gás natural (GN) têm crescido a uma taxa de 3,4% ao ano. Para efeito de comparação, as reservas de petróleo crescem 2,4% ao ano. O volume das reservas comprovadas dobrou neste período, devido principalmente a sucessos exploratórios e novas técnicas de avaliação de alguns campos existentes. Segundo estimativas, as reservas atuais são suficientes para 56 anos de produção nos níveis de 2005.
Aproximadamente 44% das reservas comprovadas se encontram em cerca de vinte mega campos e campos super gigantes, entre os quais destaca-se o maior deles, o campo não associado a petróleo ao largo da costa do Iraque e do Qatar.
  • Entretanto, quando se trata das estimativas das reservas recuperáveis de GN, não há consenso quanto ao valor exato. Os dados compilados pelo Conselho Mundial de Energia apresentam uma dispersão de ± 4,5% ao redor do valor de 177 trilhões de m3. Quanto ao gás ainda não descoberto, a quantidade tem sido subestimada, segundo os especialistas. A exploração de GN está em estágio menos desenvolvido que a do petróleo, e muitos campos ainda não foram totalmente mapeados. Além disso, novos depósitos associados a leitos de carvão (coal-bed methane) e outras fontes não-convencionais (por exemplo, o hidrato de metano) ainda são muito pouco explorados.
Segundo o CEDIGAZ, Centro Internacional de Informações da Indústria do Gás, as reservas atuais são suficientes para 130 anos se o consumo for mantido nos patamares atuais.
  • No Brasil, a produção de GN foi de 50 milhões de m3/dia em 2007, com um crescimento de 2,5% em relação a 2006. As reservas comprovadas tiveram aumento de 5% em relação ao ano anterior.O consumo de GN no Brasil se dá basicamente nos setores industrial e energético, mas a utilização no setor de transportes vem aumentando bastante nos últimos anos.
Destacam-se o grande crescimento nos setores industrial e de transporte, onde o gás tem substituído o óleo combustível e os combustíveis derivados de petróleo, respectivamente. O Brasil, porém, tem enfrentado alguns problemas no fornecimento de GN devido a instabilidades políticas na Bolívia, um de seus principais fornecedores, o que tem levado a flutuações de preço indesejáveis, que afetam principalmente o setor industrial.

Petróleo:
  • As reservas comprovadas de petróleo, avaliadas pelo Conselho Mundial de Energia e pela British Petroleum (BP), ainda são suficientes para permitir uma base de consumo de médio prazo. Segundo dados do Conselho (muito próximos aos da BP), com base nas informações dos países membros, as reservas mundiais eram, ao final de 2005, de 1.238 trilhões de barris (160 bilhões de toneladas), cerca de 117 bbl acima dos valores ao final de 2002. Além destas reservas, há, segundo algumas estimativas otimistas, a possibilidade de recuperação de 244 bilhões de toneladas adicionais, ou seja, um valor 52% superior às reservas comprovadas atuais.
Entretanto, espera-se um aumento do consumo de petróleo durante os próximos 30 anos, de 85 milhões de barris/dia em 2006 para 118 milhões de barris/dia em 2030. Além disso, o pico de produção de petróleo deverá ocorrer entre 2010 e 2020. Trata-se de uma combinação perigosa, e, atualmente, já atingimos o estágio em que sete dos dez maiores consumidores de petróleo não produzem petróleo suficiente para suprir suas demandas. Cria-se o problema, cada vez mais grave, da “segurança energética”. O preço do barril de petróleo saltou de US$ 25 em 2000 para US$ 140 em junho de 2008, logo antes da crise do sistema financeiro mundial que atravessamos atualmente. Em 15/01/09, o preço havia caído a US$ 36,22 como reflexo da crise, mas espera-se uma retomada dos preços à medida que a crise for sendo superada. A OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) anunciou recentemente que espera uma queda de 0,2% (equivalente a 18 milhões de barris/dia) na demanda por petróleo em 2009, como reflexo da crise econômica.
  • No Brasil, os dados sobre a produção de petróleo são associados à produção de gás natural liquefeito (GNL). Em 2007, a produção total de petróleo e GNL sofreu ligeira redução (0,4%) em relação a 2006, pois, embora tenha havido aumento na produção de petróleo, observou-se uma redução no processamento de gás natural. Em 2007, pela primeira vez, o país teve saldo positivo na balança comercial referente aos derivados de petróleo, devido principalmente ao aumento da exportação de gasolina (37% em relação a 2006).
O principal produto derivado de petróleo consumido no país é o óleo diesel, fruto da estrutura de transporte de cargas, fortemente dependente do setor rodoviário. Em 2007, houve crescimento de 6% no consumo de óleo diesel.
  • O Brasil é um país de dimensões continentais, que não possui grandes acidentes naturais, sendo, portanto, talhado para o transporte ferroviário. As razões que levaram o país a optar pelo transporte rodoviário de cargas, em detrimento do transporte ferroviário são eminentemente políticas e fogem ao escopo deste trabalho. Entretanto, a transição para uma matriz energética mais eficiente e menos dependente dos combustíveis fósseis passa necessariamente por uma revisão deste modelo de transporte de cargas. Se considerarmos que aproximadamente 95% do combustível de um automóvel ou caminhão são gastos para colocar o veículo em movimento e nas retomadas de velocidade, a superioridade do transporte ferroviário sobre o rodoviário fica ainda mais evidente. 
Quanto às reservas de petróleo, as novas descobertas feitas pela Petrobras nos últimos dois anos na Bacia de Santos vêm sendo consideradas pelos especialistas como as maiores descobertas de petróleo no mundo em anos recentes. O campo de Tupi, com reservas de 5 a 8 bilhões de barris, ampliou em 60% as reservas comprovadas da empresa. O chamado petróleo do pré-sal é um petróleo de qualidade superior ao normalmente encontrado no país, já que sua fração de compostos leves é maior, o que facilita o refino. A companhia petrolífera espanhola Repsol, que lidera um dos consórcios de exploração de petróleo na Bacia de Santos, anunciou em 15/01/09 a descoberta de hidrocarbonetos no campo Panoramix, a 129 km da costa paulista. Embora ainda não haja estimativas das reservas, tanto a Petrobras quanto a companhia inglesa BG Group anunciaram grandes investimentos na região: a companhia inglesa investirá US$ 4 bilhões e a Petrobras, embora não tenha divulgado o valor do investimento, pretende colocar nove plataformas novas em operação entre 2009 e 2013. Assim, o Brasil passará, num futuro não tão distante, a utilizar este petróleo, aumentando significativamente a participação das fontes não renováveis na sua matriz energética.
  • Um outro ponto importante que deve ser destacado é que a necessidade de substituição do petróleo como fonte de energia não é apenas desejável sob o ponto de vista ambiental. Além da geração de energia, existem frações do petróleo que são de extrema importância como matéria- prima para a indústria química. Ao contrário do setor energético, ainda não há alternativas economicamente viáveis para a substituição do petróleo como insumo industrial. Lembramos que a “transformação” do petróleo em plásticos, para citar apenas um exemplo, não acarreta emissão de grandes quantidades de CO2, uma vez que o carbono permanece fixo no produto final. O petróleo é um produto valioso demais para continuar sendo queimado em motores!

O Brasil necessita dessa matriz energética para crescer, segundo Dráuzio Lima Atalla, supervisor de Novas Usinas da Eletronuclear. “Nós somos subconsumidores de energia elétrica. Nós somos imensamente pobres em energia elétrica”, argumentou à Agência Brasil. (2011)

Urânio e energia nuclear:
  • A utilização de energia nuclear na matriz energética é fonte de grandes controvérsias entre os especialistas. Enquanto alguns defendem a erradicação das usinas nucleares, outros, antes defensores desta tese, passaram a apontar a energia nuclear como a única fonte de energia capaz de evitar as mudanças climáticas catastróficas que se anunciam, como resultado do aquecimento global provocado pela emissão de gases causadores do efeito estufa (GEE). Entre estes novos defensores da energia nuclear estão Patrick Moore, fundador da organização de defesa ambiental Greenpeace e James Lovelock, criador da hipótese de Gaia, segundo a qual a Terra é um organismo auto regulado.
As reservas mundiais comprovadas de urânio cresceram 4% entre 2003 e 2005, chegando a 3,3 milhões de toneladas de urânio recuperável a um custo inferior a US$ 130/kgU. Além do urânio, as reservas de tório, um elemento três vezes mais abundante que o urânio na crosta terrestre, são de 4,5 milhões de toneladas, uma estimativa conservadora, já que as reservas têm sido exploradas de forma bastante limitada.A produção mundial de urânio, que foi de 41.700 toneladas em 2005, sendo que onze países respondem por 97% deste total. Os maiores produtores são o Canadá, a Austrália e o Cazaquistão.
  • O principal fator que limita a expansão da energia nuclear atualmente é a produção de combustível menor que a demanda, o que vem ocorrendo desde a década de 1990. Mas isto se deve não à falta de reservas, e sim às poucas instalações para mineração e enriquecimento. Esta demanda vem sendo gradativamente suprida por uma série de fontes secundárias: desmontagem de armamentos dos arsenais dos Estados Unidos e dos países da antiga União Soviética, diminuição dos estoques militares, reprocessamento de combustível nuclear usado e reciclagem de urânio para produção de urânio reprocessado.
Em 2007 havia 435 usinas nucleares em operação no mundo, gerando um total de 367 GW. Vários países modernizaram suas usinas, resultando em um aumento médio de eficiência da ordem de 20%.
A energia nuclear é mais segura do que muitos imaginam, sendo que apenas um acidente grave – Chernobyl – ocorreu em mais de 12.400 anos-reator acumulados em todo o mundo. O acidente de Three Mile Island em 1979 não pode ser considerado grave. Afinal, a estrutura de confinamento funcionou exatamente como se esperava, impedindo o vazamento de radiação para o ambiente. As ogivas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki em 1945, e obras como o filme “Síndrome da China” (1979), contribuíram para criar uma imagem distorcida da segurança da energia nuclear. Há, porém, questões preocupantes relativas ao uso da energia nuclear:
  • Os resíduos são perigosos: passados 40 anos, a radioatividade dos resíduos cai a um milésimo do valor que tinha ao ser removido do reator. E o termo resíduo talvez não seja o mais adequado, já que 95% da energia potencial permanece no combustível depois do primeiro ciclo. Em 2006, os Estados Unidos suspenderam a proibição da reciclagem de combustível nuclear, o que permitirá sua reutilização, reduzindo significativamente a quantidade de resíduo gerado nas usinas. Há alguns anos a França, o Reino Unido e a Rússia vêm reciclando seu combustível nuclear, e em 2006 o Japão se juntou a eles.
  • O combustível nuclear pode ser desviado para a produção de armamentos: de fato, esta é uma questão muito séria, que deve ser tratada nas mais altas esferas políticas dos países produtores. Ainda assim, não acreditamos que este seja motivo para banir completamente o uso da energia nuclear para fins pacíficos. Trata-se de um caso em que os benefícios superam em muito os riscos, e onde o desenvolvimento tecnológico pode desempenhar um papel importante. O Japão introduziu recentemente técnicas de reprocessamento em que o plutônio jamais é separado do urânio, tornando muito difícil a utilização de material civil na produção de armamentos.
Seja qual for a estratégia adotada, o incremento no uso da energia nuclear passa necessariamente pela cooperação internacional, com a priorização de uma agenda diplomática na qual este assunto seja tratado da maneira muito abrangente e cuidadosa. Afinal, os carros bomba usados por terroristas são geralmente feitos com materiais bastante simples e disponíveis a qualquer cidadão: óleo diesel, fertilizante e carros!

Energia geotérmica:
  • A energia geotérmica é, numa definição bastante simples, o calor natural da terra. A exploração desta fonte de energia pode ser feita de duas maneiras: a primeira, é o uso direto do calor transferido por condução a partir do interior da Terra até regiões específicas próximas à superfície e a segunda, a utilização de bombas de calor que se aproveitam da diferença de temperatura entre o ambiente e o solo. Os sistemas de exploração direta do calor geotérmico estão restritos às regiões de fronteira entre as placas tectônicas como, por exemplo no “anel de fogo” do Pacífico e na Islândia.
No Brasil, a energia geotérmica é usada quase que exclusivamente para fins de recreação, em parques de fontes termais, como Caldas Novas (GO), Piratuba (SC), Araxá (MG), Olímpia, Águas de Lindóia e Águas de São Pedro (SP).

Energia hidráulica:
  • A energia hidráulica, ou hidrelétrica, é uma das maiores das fontes perpétuas ou renováveis de energia, correspondendo, em 2006, a 17% de todas as fontes renováveis de energia no mundo.
A energia hidráulica é explorada em mais de 160 países, mas somente cinco (Brasil, Canadá, China, Rússia e Estados Unidos) são responsáveis por mais da metade da produção mundial. A geração atingiu 3,1 TWh em 2006, correspondendo a aproximadamente 20% do potencial economicamente explorável. Atualmente, a capacidade instalada é de 882 GW, com um potencial estimado em 15.900 TWh.
  • Nota-se um grande contraste entre o Oriente Médio e a África em relação às demais regiões. No primeiro caso, devido à abundância de combustíveis fósseis e limitação dos recursos hídricos e, no caso africano, devido a uma combinação infeliz de abundância de combustíveis fósseis em algumas regiões, limitação dos recursos hídricos em algumas regiões, e, o que é mais grave, uma falta generalizada de recursos para investimento na construção de usinas hidrelétricas de médio e grande porte.
Um dado interessante quando se fala em expansão das fontes renováveis de energia no mundo é a enorme capacidade de ampliação do parque hidrelétrico, que pode ser feita de duas maneiras: a primeira é a modernização e expansão das usinas existentes. Até 2030, a grande maioria das usinas hidrelétricas do mundo deverá passar por processos de modernização e ampliação, onde for possível. A segunda maneira de ampliar a geração de energia hidráulica é a instalação de geradores em represas onde não há geração de energia. Existem no mundo cerca de 45.000 represas de grande porte e, a maioria delas, não conta com geradores de eletricidade.
  • Em termos econômicos, a energia hidráulica apresenta vantagens importantes: os custos operacionais são baixíssimos em comparação com o investimento inicial. Além disso, a independência em relação aos combustíveis fósseis torna esta fonte praticamente insensível às flutuações do preço do petróleo. O mesmo não pode ser dito, por exemplo, do etanol, que depende de insumos (fertilizantes, transporte etc.) influenciados pelo preço das commodities.
Como desvantagens, pode-se citar o custo elevado de implementação das usinas, se comparado a outras fontes, o tempo relativamente longo entre a concessão e a entrada em operação e a dependência de um regime regular de chuvas, além do forte impacto socioambiental causado pela inundação de grandes áreas, com o consequente deslocamento de comunidades inteiras e a destruição do habitat natural de espécies nativas e endêmicas.
  • Os maiores desafios no setor hidráulico são a modernização das instalações existentes e, principalmente, o desenvolvimento de um modelo de financiamento para o setor.
No Brasil, a participação da energia hidráulica chega a 14,9% da matriz energética total, e corresponde a 85% da eletricidade gerada. A  evolução da participação desta fonte na oferta de energia elétrica em três momentos: 1970, 1994 a 2007. A redução entre 1994 e 2007 deve-se principalmente ao aumento da participação dos autoprodutores independentes, que vêm utilizando a biomassa, principalmente o bagaço de cana, na geração de eletricidade, além da entrada em operação de usinas termelétricas movidas a gás natural e nucleares.
  • O Brasil ocupa uma posição única no mundo, contrastando fortemente com a predominância da energia elétrica oriunda da queima de combustíveis fósseis no resto do planeta.  Em termos de geração de eletricidade, a participação das fontes renováveis atinge 90% no Brasil, contra 16% dos países da OECD e 18% no mundo.
A geração de eletricidade chegou a 445 TWh em 2007, um aumento de 6% em relação a 2006. A participação da energia hidráulica cresceu 7% e a geração a partir de combustíveis não renováveis caiu 9% em 2007 (−12,3% na energia nuclear e −18,6% na energia gerada a partir do gás natural). O resultado foi um ligeiro aumento na participação das fontes renováveis no setor elétrico. O país importou pouco mais de 41 TWh de eletricidade da Argentina e do Paraguai, de modo que a oferta total chegou a 486 TWh.
  • O Brasil é atualmente o terceiro maior produtor de energia hidráulica do mundo, ficando atrás apenas da China e do Canadá. Em termos de capacidade teórica, o potencial passa de 3000 TWh/ano, dos quais 800 TWh são atualmente economicamente viáveis.
A energia hidráulica não é, entretanto, livre de riscos. Temos ainda na memória o racionamento de eletricidade decretado em junho de 2001, causado pela quantidade de chuvas muito abaixo do normal no biênio 2000-2001. Os motivos que levaram ao racionamento, além da falta de chuvas, são complexos e fogem ao escopo desta contribuição, mas dão uma medida dos riscos associados a uma matriz energética com grande predominância de uma única fonte, ainda que renovável e ambientalmente correta.
  • Percebe-se que a situação atual é bem menos crítica que no início do racionamento, principalmente nas regiões sudeste e nordeste, as mais afetadas em 2001, devido aos índices pluviométricos do verão 2008/2009, que se encontram bastante acima da média histórica.
Ainda assim, diversos especialistas afirmam que o país não está livre do risco de um novo racionamento, já que, mesmo com os reservatórios em nível elevado, o crescimento econômico do país tem levado a um forte aumento da demanda. Há, no momento, 13 usinas de médio e grande porte licitadas que estão em construção há mais de 5 anos, e o histórico de atrasos nos cronogramas não garante o abastecimento após 2010. Para entrar em operação, uma usina hidrelétrica precisa obter as licenças prévia, de instalação e de operação, concedidas pelo Ministério do Meio Ambiente. Observa-se uma falta de coordenação entre as áreas do governo no setor energético, o que pode demandar um período de tempo variável, que nem sempre está de acordo com as previsões do Ministério do Planejamento, por exemplo. O resultado é que a capacidade real instalada não corresponde necessariamente à prevista. Este descompasso poderia ser abrandado se o governo realizasse Avaliações Ambientais Estratégicas (AAE) – estudo do impacto ambiental de políticas, planos e programas – do setor energético.
  • Com a demora na concessão de licenças ambientais para a construção de hidrelétricas, o governo estuda colocar em funcionamento usinas termelétricas a gás e óleo combustível com capacidade somada de 20.800 MW até 2017, o que pode resultar em um aumento de até cinco vezes na emissão de CO2 pelo país.
Biocombustíveis: etanol e biodiesel:
  • Os biocombustíveis são combustíveis renováveis derivados de matéria-prima biológica e incluem o bioetanol, ou simplesmente etanol, o biodiesel, o biogás (metano). Destes, o etanol é o biocombustível mais utilizado e cuja produção mais cresce no mundo, com um aumento de 4,4 bilhões de barris em 1980 para 46,2 bilhões de barris em 2005. Os maiores produtores mundiais de etanol são Estados Unidos (16,1 bilhões de barris ), Brasil (16 bilhões de barris ) e China (3,8 bilhões de barris ). O etanol é produzido principalmente a partir da cana-de-açúcar (Brasil) e milho (EUA), embora possam ser usados outros insumos, incluindo gramíneas, resíduos da agricultura e resíduos municipais. Entretanto, apenas a produção a partir da cana de açúcar e do milho são economicamente viáveis atualmente, com grande vantagem para o processo a partir da cana, onde a etapa de conversão do amido em açúcares não é necessária. Assim, o etanol brasileiro tem custo de produção menor, com potencial para redução de custos, à medida que as técnicas de produção são aprimoradas e que novas variedades de cana, mais ricas em açúcar, são introduzidas. Devemos destacar, entretanto, que a produção de etanol a partir do milho é fortemente subsidiada nos Estados Unidos, o que evidencia ainda mais a competitividade do etanol brasileiro.
A produção mundial de biodiesel também teve forte crescimento entre 1991 (71 mil barris) e 2005 (3,9 bbl).33 Os maiores produtores mundiais são Alemanha, França, Estados Unidos e Itália. A produção brasileira em 2007 foi de 2,3 milhões de barris.8 O biodiesel pode ser produzido a partir de diferentes óleos vegetais (por exemplo, palma, girassol, algodão, semente de colza, soja e amendoim, entre outros). Uma curiosidade é que Rudolf Diesel chegou a usar óleo de amendoim em motores diesel em 1900, tendo afirmado em 1911 que “O motor diesel pode ser alimentado com óleos vegetais e ajudaria consideravelmente no desenvolvimento da agricultura dos países que o utilizarem”.
  • Pode-se também produzir biodiesel a partir de gordura animal e pelo reuso de óleo (proveniente de fritura); além disso, estudos recentes mostram que o biodiesel obtido a partir do óleo produzido por microalgas tem potencial para superar as demais matérias-primas, devido a seu alto rendimento.
No Brasil, usa-se predominantemente o óleo de soja na produção de biodiesel, e a Lei Federal 11.097, de 2005, determina que se atinja um percentual de 5% de biodiesel no óleo diesel de petróleo até 2013.
  • Nota-se a grande parcela de produção de etanol na região sudeste (70%), principalmente no Estado de São Paulo, que concentra 133 das 300 usinas do Brasil.
O uso dos biocombustíveis pode levar a uma redução significativa nas emissões de gases causadores do efeito estufa (GEE), mas há questionamentos quanto aos possíveis danos ambientais. O aumento na produção de biocombustíveis deverá levar a grandes alterações nos padrões de uso do solo, com a conversão de áreas não plantadas, como florestas e cerrados, em área de cultivo. Um estudo recente avaliou que um aumento de 75% na produção de etanol derivado do milho nos Estados Unidos até 2016 levaria a uma transição de 12,8 milhões de hectares (ha) de outras lavouras para a produção de milho. A consequente redução nas exportações de trigo dos EUA, por exemplo, poderia levar a uma expansão mundial da agricultura da ordem de 10,8 milhões de ha, sendo 2,8 milhões de ha somente no Brasil. Os danos resultantes ao ecossistema podem ser bastante significativos, já que muitas destas lavouras são cultivadas em pontos de alta biodiversidade. Como exemplos, podemos citar a palma nas regiões de Sundaland, Wallacea e florestas da África Oriental e a soja e a cana-de-açúcar no cerrado brasileiro.
  • Existe ainda o potencial de elevação no preço global dos alimentos: no caso do milho, devido ao desvio para a produção de etanol; no caso da cana, devido à utilização de áreas antes cultivadas com alimentos. No biênio 2007-2008 houve grande crescimento no preço de alimentos como trigo (130%), arroz (98%) e milho (38%). Este crescimento não pode ser atribuído exclusivamente à questão dos biocombustíveis e vários fatores devem ser considerados, tais como adversidades climáticas (que podem ou não estar relacionadas ao aquecimento global), especulação, criação de estoques regulatórios preventivos e políticas equivocadas de embargo de alimentos.
A questão dos biocombustíveis é, portanto, bastante complexa, e não se pode simplesmente afirmar que devemos substituir totalmente o petróleo pelo etanol e o biodiesel, já que, como afirmamos anteriormente, existem frações valiosas do petróleo que não podem ser atualmente substituídas pelo uso de biocombustíveis de maneira economicamente viável.

Energia solar:
  • O Sol é a fonte de energia primária mais abundante para nosso planeta. Num sentido bastante amplo, pode-se dizer que, com exceção da energia nuclear, todas as outras fontes, renováveis ou não, são apenas diferentes formas de energia solar.
A quantidade de radiação solar que atinge o planeta anualmente equivale a 7.500 vezes o consumo de energia primária de sua população. A incidência de radiação varia conforme a posição geográfica, podendo atingir até 170 W/m.
  • Se apenas 0,1% da energia solar pudesse ser convertida com uma eficiência de 10%, ainda assim a energia gerada seria quatro vezes maior que a capacidade mundial total de geração de energia, que é de 3000 GW. A radiação solar que atinge anualmente a superfície da Terra, 3,4×106 EJ, é uma ordem de grandeza maior que a soma de todas as fontes não renováveis (provadas e estimadas), incluindo os combustíveis fósseis e nucleares.
Além da utilização no aquecimento de água através de coletores solares, a energia solar pode ser usada para a geração de eletricidade através do uso de painéis fotovoltaicos, que convertem diretamente a energia solar em energia elétrica (energia solar fotovoltaica), ou pelo aquecimento de fluidos cujos vapores são usados para movimentar turbinas geradoras de eletricidade (energia solar térmica).
  • No mundo, a demanda por painéis fotovoltaicos tem crescido a uma taxa de 35% ao ano. Isto fez com que o custo da energia solar fotovoltaica subisse recentemente, já que a indústria de wafers de silício não tem sido capaz de acompanhar a demanda. A produção anual de painéis fotovoltaicos atingiu 1700 MW em 2005, sendo o Japão, a União Européia e os Estados Unidos os principais produtores.
No Brasil, a capacidade instalada é estimada entre 12 e 15 MW, igualmente divididos entre sistemas de telecomunicações e sistemas rurais remotos. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) é responsável pela medição do potencial de insolação em suas 187 estações de monitoramento. Seus dados permitem concluir que a região nordeste tem o maior potencial, com valores médios de 206 W/m2. De modo geral, o Brasil é um bom candidato à implementação de painéis fotovoltaicos, pois os valores anuais de insolação, entre 1800 kWh/m2/ano e 1950 kWh/m2/ano são inferiores somente aos encontrados nas regiões desérticas das Américas do Norte e do Sul, norte da África, Oriente Médio, China e Austrália. Há atualmente vários centros dedicados ao desenvolvimento e aplicação da energia solar no Brasil, entre os quais destacamos o Centro de Referência em Energia Solar e Eólica Sergio Salvador de Brito (CRESESB), ligado ao Centro de Pesquisas em Energia Elétrica (CEPEL) e o Centro Brasileiro Para o Desenvolvimento da Energia Solar Fotovoltaica (CB-Solar).
  • Quanto à energia solar térmica, a capacidade instalada no mundo deverá atingir 3000 MW nos próximos anos, dos quais mais de 2000 MW estarão na Espanha, devido a uma conjunção de excelentes recursos solares e uma firme política governamental de incentivo.
Não há no momento planos oficiais de instalação de usinas térmicas solares no Brasil, embora esta seja, em nossa opinião, uma alternativa extremamente interessante para diversificar a matriz renovável brasileira. Porém, os custos de implantação destas usinas ainda são elevados, fazendo com que o preço final da energia fique em torno de US$ 0,10 a 0,14/kWh, bastante acima, por exemplo, da energia hidráulica, que tem um custo de US$ 0,04/kWh.

Energia eólica:
  • O potencial eólico do planeta é enorme. Segundo estimativas do Conselho Mundial de Energia, se 1% da área terrestre fosse utilizada na geração de energia eólica, a capacidade mundial de geração seria equivalente ao total gerado através de todas as outras fontes.8 A capacidade ao largo da costa é ainda maior, sendo que no caso da Europa, o potencial até 30 km da costa é suficiente para atender às necessidades energéticas atuais da União Européia.
A energia eólica é a fonte renovável que cresce mais rapidamente no mundo, sendo que a previsão da capacidade global para 2009 é de 128.046 MW (cenário de referência), com uma geração anual de 280 TWh, correspondendo a um crescimento de 12% em relação a 2008.67 Para se ter uma idéia, os novos aerogeradores chegam a ter capacidades de 2 MW (em terra) e 5 MW (no mar), estes últimos com hélices de até 110 m de diâmetro. Para efeito de comparação, os primeiros aerogeradores, há cerca de 20-25 anos atrás, tinham capacidades de 50-100 kW, com hélices de 10 a 20 m de diâmetro.
O desenvolvimento da energia eólica de forma ainda mais acelerada irá depender do nível de apoio governamental que, por sua vez, é bastante sensível às pressões da comunidade, mas esta é certamente uma das alternativas mais promissoras na atualidade.
  • No Brasil, o potencial eólico é de 143 GW, dos quais 30 GW poderiam ser efetivamente transformados em projetos a médio prazo. A capacidade instalada atualmente é de 22 MW, gerando aproximadamente 54 GWh/ano, e as áreas mais adequadas à geração de energia eólica encontram-se no litoral do nordeste e norte, do Rio Grande do Norte até o Amapá, em áreas do interior da Bahia e de Minas Gerais, e no litoral do Rio Grande do Sul. 
A crise econômica e o setor energético:
  • A crise do sistema financeiro que atravessamos atualmente tem tido forte influência sobre quase todos os setores da sociedade e suas consequências, a longo prazo, ainda são de difícil previsão. Porém, o que temos visto num primeiro momento é preocupante: com a queda nos preços do petróleo de US$ 150 para US$ 30, as grandes companhias de petróleo têm deixado de investir em novas tecnologias.
Durante o Fórum Mundial de Energia do Futuro, em Abu Dhabi, de 19 a 21/01/09, o assunto foi debatido em diversas esferas. Vivienne Cox, diretora da Divisão de Energias Alternativas da British Petroleum afirmou que “Não há como negar que está cada vez mais difícil conseguir financiamentos para os projetos de energia verde”, e que “a empresa deverá fazer nova avaliação da situação em fevereiro”.
  • Segundo a empresa britânica de consultoria New Energy Finance, o valor das ações de companhias ligadas à energia verde, que vinha crescendo 50% ao ano nos últimos 3 anos, teve uma queda acentuada no segundo semestre de 2008.
O governo russo precisou recentemente socorrer quatro grandes empresas do setor energético, com um pacote de US$ 9 bilhões, para que pudessem arcar com sua dívida externa. Estas empresas respondem, juntas, por 70% do petróleo e 90% do gás natural extraídos naquele país. No Brasil, a empresa vencedora de recente leilão para a construção de seis usinas hidrelétricas, com capacidade total de 611 MW precisou desistir da empreitada por não conseguir crédito para depositar junto ao governo o montante necessário como garantia de construção das usinas.
  • A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), responsável pelo Balanço Energético Nacional (BEN), anunciou recentemente que houve uma queda de 1,8% no consumo de energia elétrica no país em 2008, puxada pelo setor industrial. Uma queda desta magnitude não era observada desde o racionamento de 2001. Um resultado disto é que o Comitê de Monitoramento do Sistema Elétrico (CMSE) anunciou em 09/01/2009 que todas as usinas termelétricas do país serão desligadas, à exceção de Angra I e II.
Ainda assim, a Petrobras anunciou a manutenção de investimentos de US$ 174,4 bilhões até 2013, sendo US$ 92 bilhões na área de exploração e produção.Por outro lado, mesmo com o caos financeiro dos últimos meses de 2008, há, tanto na comunidade acadêmica quanto no meio empresarial, uma sensação de que chegou a hora das fontes renováveis, principalmente com as mudanças esperadas nos Estados Unidos, sob o governo de Barack Obama, iniciado em janeiro de 2009.
  • A impressão geral é que é tempo de mudanças: mudança de um sistema financeiro internacional totalmente desregulamentado que, deixado por si só, levou à comprovação da máxima que, no sistema capitalista, os lucros são de poucos e os prejuízos são divididos por todos, e mudança de uma matriz energética predominantemente poluente, insustentável a médio e longo prazo, que compromete o meio ambiente não apenas para as gerações futuras, mas também as atuais, para uma matriz mais renovável, limpa e sustentável.
Outras Considerações:
  • As evidências de que o uso de combustíveis fósseis tem causado danos ambientais devido ao aquecimento global são irrefutáveis. A finitude dos recursos fósseis, aliada a estes danos ambientais, tem levado a humanidade a uma busca cada vez mais intensa por fontes de energia limpas e renováveis.
Neste panorama mundial em mutação, o Brasil larga em vantagem por ter grande parte de sua matriz energética baseada em fontes renováveis. Porém, exige-se uma diversificação cada vez maior da matriz energética, de modo a minimizar as chances de um novo racionamento de energia no país. O crescimento econômico recente e a descoberta de grandes reservas de petróleo e gás natural têm levado a um aumento da participação das fontes não renováveis na matriz energética do Brasil. Os impactos deste aumento deverão ser compensados pelo incremento no uso de fontes renováveis: biocombustíveis, pequenas centrais hidrelétricas (PCH) e energias solar e eólica, além do investimento em pesquisa e desenvolvimento de fontes renováveis ainda não consolidadas, como hidrogênio (células a combustível), biocombustíveis derivados de outras fontes, como algas, por exemplo, e energia solar fotovoltaica baseada em semicondutores diferentes do silício (TiO2, ZnO e SnO2, entre outros).
  • Os efeitos da crise do sistema financeiro mundial ainda são difíceis de se prever, já que a estrutura do sistema passará necessariamente por um rearranjo profundo nos próximos anos. Embora o efeito inicial sobre as fontes renováveis seja negativo, com a suspensão e cortes de investimentos no setor, a expectativa é de que nos próximos anos a situação seja revertida, com forte crescimento de investimentos em fontes renováveis, especialmente biomassa e energias solar e eólica.
Não há mais como evitar os efeitos causados por séculos de descaso com o meio ambiente. O que precisamos agora é encontrar, o quanto antes, e de maneira globalmente coordenada, formas de minimizar estes efeitos. Assim, esforços devem ser feitos em três grandes frentes: redução no uso de combustíveis fósseis; promoção das fontes renováveis de energia e, aumento na eficiência energética.
No contexto da transição para a energia verde, as oportunidades que se oferecem aos profissionais da química são imensas: implantação de processos mais eficientes; desenvolvimento de novos materiais inorgânicos e poliméricos; uso racional dos recursos finitos (petróleo e gás natural); substituição de insumos derivados do petróleo por derivados de fontes renováveis e, desenvolvimento de espécies mais resistentes às pragas e com maior produtividade, através da engenharia genética.
  • Como comentário final, gostaríamos de ressaltar que as áreas de energia, meio ambiente e, principalmente, economia, estão em constante mutação, e novas idéias, propostas e soluções são apresentadas a cada dia. Esperamos ter mostrado, especialmente para os alunos de graduação e pós-graduação nos cursos de química, que as oportunidades e desafios são inúmeras, e que certamente os químicos ocuparão lugar de destaque na transição obrigatória de um modelo não renovável para um modelo sustentável de produção, seja de energia, seja de insumos, seja de produtos acabados.

O objetivo lança campanhas publicitarias com o objetivo de conscientizar a sociedade para evitar desperdícios e usar de forma adequada os aparelhos elétricos que mais consomem energia, como chuveiro elétrico, ar-condicionado, geladeira e ferro de passar. (03/2015)



domingo, 29 de março de 2015

Mercúrio - (Hg)

Mercúrio metal liquido

  • Mercúrio é um metal líquido à temperatura ambiente, conhecido desde os tempos da Grécia Antiga. Também é conhecido como hidrargírio, hidrargiro , azougue e prata-viva, entre outras denominações. Seu nome homenageia o deus romano Mercúrio, que era o mensageiro dos deuses. Essa homenagem é devida à fluidez do metal. O símbolo Hg vem do grego "hydrargyrum" que significa prata líquida.
O mercúrio é um elemento químico de número atômico 80 (80 prótons e 80 elétrons) e massa atômica 200,5 u. É um dos seis elementos que se apresentam líquidos à temperatura ambiente ou a temperaturas próximas. Os outros elementos são os metais césio, gálio, frâncio e rubídio e o não metal bromo. Dentre os seis, porém, apenas o mercúrio e o bromo são líquidos nas condições padrão de temperatura e pressão.
  • O mercúrio pertence ao grupo (ou família) 12 (anteriormente chamada 2B) e faz parte da classe dos metais de transição. Tal grupo é ainda chamado família do zinco, na tabela periódica.
Normalmente utilizado em instrumentos de medidas (termômetros e barômetros), lâmpadas fluorescentes e como catalisador em reações químicas.

Características gerais:
  • É um líquido prateado que na temperatura normal é metal e inodoro. Não é um bom condutor de calor comparado com outros metais, entretanto é um bom condutor de eletricidade. Estabelece liga metálica facilmente com muitos outros metais como o ouro ou a prata produzindo amálgamas. É insolúvel em água e solúvel em ácido nítrico. 
Quando a temperatura é aumentada transforma-se em vapores tóxicos e corrosivos mais densos que o ar. É um produto perigoso quando inalado , ingerido ou em contato, causando irritação na pele, olhos e vias respiratórias. É compatível com o ácido nítrico concentrado, acetileno, amoníaco, cloro e com outros ametais.


Formas físico-químicas:
  • O mercúrio, está presente em diversas formas (Hg metálico, orgânico, inorgânico) e pode encontrar-se em três estados de oxidação (0, +1, +2), em geral facilmente interconversíveis na natureza. Tanto os humanos, como os animais estão expostos a todas as formas através do ambiente.
O mercúrio metálico ou elementar, no estado de oxidação zero (Hg0) existe na forma líquida à temperatura ambiente, é volátil e liberta um gás monoatômico perigoso: o vapor de mercúrio. Este é estável, podendo permanecer na atmosfera por meses ou até anos, revelando-se, deste modo, muito importante no ciclo do mercúrio, pois pode sofrer oxidação e formar os outros estados: o mercuroso, Hg+1, quando o átomo de mercúrio perde um elétron e o mercúrico, Hg+2, quando este perde dois elétrons.
  • Quando se combina com elementos como o cloro, enxofre ou oxigênio, obtêm-se os compostos de mercúrio inorgânico, também designados como sais de mercúrio (sais mercurosos e mercúricos). Por outro lado, se um átomo de mercúrio se liga covalentemente, a pelo menos um átomo de carbono, dá origem a compostos de mercúrio orgânico (metilmercúrio, etilmercúrio, fenilmercúrio).
Com exceção do mercúrio, os metais se caracterizam por estarem no estado sólido em temperatura ambiente.

Compostos:
  • Fulminato (Hg(CNO)2): usado como detonante. É muito corrosivo e altamente venenoso.
  • Cloreto de mercúrio (I) ou calomelano (Hg2Cl2): composto branco, pouco solúvel em água. Tem-se usado como purgante, anti-helmíntico e diurético, e o cloreto de mercúrio (II), ou sublimado corrosivo, empregado como desinfetante. Foi o primeiro remédio eficaz contra a sífilis. 
  • Sulfeto de mercúrio ou cinábrio (HgS): mineral de cor vermelho púrpura, translúcido, utilizado em instrumental científico, aparatos elétricos, ortodontia, etc. 
  • Timerosal (COO-Na+(C6H4)(S-Hg-C2H6)): usado como agente bacteriostático análogo ao mertiolate. 
  • Mercúrio vermelho. Provavelmente usado na fabricação de bombas sujas.
Aplicações:
  • Seu uso mais antigo, desconsiderando a sua aplicação na mineração do ouro e da prata, foi na fabricação de espelhos, ainda usado atualmente. Também é utilizado em instrumentos de medidas (termômetros e barômetros), lâmpadas fluorescentes e como catalisador em reações químicas. 
É utilizado na indústria de explosivos e em odontologia como elemento principal para obturação de dentes. Atualmente foi substituído nos tratamentos dentários pelo bismuto que apresenta propriedades semelhantes, porém ligeiramente menos tóxico.
  • Também apresenta aplicações em medicina através do mercoquinol (oxiquinolinsulfonato de mercúrio) e do hidrargirol (parafeniltoniato ou parafenolsulfonato de mercúrio), este último como anti-séptico, assim como outros compostos de mercúrio: hidrargol, hidrargiroseptol, iodeto mercúrico, cloroiodeto mercúrico, mercuriol, entre outros.
O mais importante de todos os usos modernos para o mercúrio está na fabricação de instrumentos para laboratórios. Estes instrumentos fazem uso das suas mais diversas propriedades físicas, tais como peso específico, fluidez, condutividade elétrica, grande coeficiente de dilatação além da sua facilidade de purificação. 
  • Entre os instrumentos, destaca-se na fabricação de termômetros, eletrodos, barômetros, instrumentos para medir pressão do sangue e como catalisador (células de mercúrio para solda eletrolítica; em energia atômica).
História:
  • Descoberto ainda na Grécia antiga, foi um dos primeiros elementos estudados e tem sido de interesse para os estudantes de química desde os dias da alquimia até a atualidade. Pode ser usado em termômetros, barômetros,lâmpadas, medicamentos, espelhos, detonadores, corantes e outros.
Em grego, hydro (ύδωρ) significa "água" e argyros (άργυρος) era o nome grego da "prata". Os romanos latinizaram o nome para hidrargirium. E como os símbolos químicos são dados pela inicial maiúscula (e uma segunda letra em minúsculo para diferenciação) do nome em latim, seu símbolo ficou sendo Hg (para não confundir com o símbolo do hidrogênio, H).

Ocorrência e obtenção:
  • O minério mais importante de mercúrio é o cinábrio cujas maiores reservas minerais são encontradas na Espanha, nas minas de Almadén.
O mercúrio pode estar associado com hidrocarbonetos gasosos e líquidos (petróleo, betumes) e também com jazidas de carvão mineral. É um elemento de origem profunda (manto terrestre) que possivelmente ascende na forma de metilou dimetil mercúrio. Também possui relação com gás hélio. Nos depósitos vulcanogênicos, quando há disponibilidade de enxofre pode precipitar como sulfeto de mercúrio (HgS) que é o cinábrio.
  • Outra forma de obtenção de mercúrio se dá por ustulação do sulfeto ou cinábrio. Nesta reação, o enxofre do mineral se oxida a SO2 e o metal livre se conduz a grandes condensadores metálicos refrigerados com água. Os depósitos de mercúrio são de origem relativamente recente, mas aparecem em rochas de todas as idades.
Riscos à saúde:
  • Geralmente quem foi intoxicado pelo vapor do mercúrio pode apresentar sintomas como dor de estômago, diarreia, tremores, depressão, ansiedade, gosto de metal na boca, dentes moles com inflamação e sangramento na gengiva, insônia, falhas de memória e fraqueza muscular, nervosismo, mudanças de humor, agressividade, dificuldade de prestar atenção e até demência. 
Mas pode contaminar-se também através de ingestão. No sistema nervoso, o produto tem efeitos desastrosos, podendo dar causa a lesões leves e até à vida vegetativa ou à morte, conforme a concentração.

Mecanismo de toxicidade:
  • O mercúrio geralmente é uma toxina protoplásmica. A patofisiologia da toxicidade do mercúrio é diretamente relacionada com a sua ligação covalente aos grupos tiol das diferentes enzimas celulares nos microssomas e na mitocôndria, o que leva à interrupção do metabolismo e da função celular. 
Como as proteínas que têm grupos tiol existem tanto nas membranas extracelulares, como nas intracelulares e ainda nas organelas e, uma vez que estes grupos representam uma parte integral na estrutura ou função da maioria das proteínas, o alvo exato para o mercúrio não é facilmente determinado, isto se realmente houver um alvo específico.
  • O órgão mais vulnerável é o sistema nervoso central (SNC), mas o sistema renal e o sistema pulmonar também são susceptíveis à toxicidade.
De entre os possíveis mecanismos de toxicidade podemos enumerar a inativação de várias enzimas, proteínas estruturais ou processos de transporte, ou alteração da permeabilidade da membrana celular pela formação de mercaptides. O mercúrio tem também afinidade, embora inferior, para se ligar aos grupos carboxilo, amida, amina e fosforilo das enzimas o que contribui para a sua toxicidade.
  • Tem sido investigado uma variedade de alterações induzidas pelo mercúrio, incluindo o aumento da permeabilidade da barreira hematoencefálica, inibição da polimerização e formação dos microtúbulos, interrupção da síntese de proteínas, paragem da replicação do DNA e interferência na atividade da DNA polimerase e na fosforilação-desfosforilação, defeito na transmissão sináptica, rompimento da membrana, desregulação do sistema imunitário e mudança na homeostase do cálcio. Estas alterações podem ocorrer individualmente ou em conjunto.
O mercúrio origina uma depleção dos níveis de glutationa, superóxido dismutase, catalase e glutationa peroxidase, o que confere uma menor proteção das células relativamente ao fenômeno de stress oxidativo. Além disso, através das alterações no estado dos tióis intracelulares, o mercúrio pode induzir a peroxidação lipídica, disfunção mitocondrial e mudanças no metabolismo do grupo heme.
  • O HgCl2 pode causar a despolarização da membrana interna mitocondrial, com consequente aumento na formação de H2O2. Estes acontecimentos estão ligados à depleção de glutationa mediada pelo Hg2+ e com a oxidação do nucleótido piridina, o que leva a uma condição de stress oxidativo caracterizado pelo aumento da susceptibilidade da membrana mitocondrial à peroxidação lipídica, dependente do ferro. 
Sabe-se também que as alterações provocadas pelo mercúrio na homeostase mitocondrial do cálcio podem exacerbar o stress oxidativo induzido pelo Hg2+ nas células renais. Como resultado do aumento da formação radicais livres e da peroxidação lipídica, o dano oxidativo no rim pode originar numerosas mudanças bioquímicas, incluindo a excreção em excesso de porfirinas na urina (porfirinúria).
  • A interação sinérgica entre as mudanças na homeostase intracelular do cálcio e o estado dos tióis intracelulares, culmina em peroxidação lipídica, ativação da proteólise dependente do Ca2+, ativação da endonuclease e hidrólise dos fosfolípideos.
Toxicologia:
  • As intoxicações por mercúrio apresentam uma graduação de efeitos proporcionais a sua ingestão e/ou acumulação.
  • As intoxicações mesmo leves por mercúrio caracterizam-se por causar anemia, anorexia, depressão, dermatite, fadiga, dores de cabeça, hipertensão, insônia, torpor, irritabilidade, tremores, fraqueza, problemas de audição e visão.
  • Intoxicações mais severas podem levar a inúmeros problemas neurológicos graves, inclusive paralisias cerebrais.
  • As enfermidades ou lesões associadas ao mercúrio recebem a denominação de: hidrargirismo ou mercurialismo e hidrargiria.
Vias de exposição:
  • O mercúrio metálico ou elementar, no estado de oxidação zero (Hg0), existe na forma líquida à temperatura ambiente, é volátil e liberta um gás monoatômico: o vapor de mercúrio. Este é quimicamente estável, podendo permanecer na atmosfera por um longo período de tempo, onde sofre oxidação e origina os compostos inorgânicos (compostos mercurosos e mercúricos).
O vapor de mercúrio presente na atmosfera é, eventualmente, convertido na forma solúvel em água e retorna à superfície terrestre nas águas da chuva. A partir daqui duas importantes mudanças químicas podem ocorrer. O metal pode ser reduzido novamente a vapor de mercúrio e retorna à atmosfera ou pode ser metilado pelos micro-organismos presentes nos sedimentos da água, incluindo a água doce ou do mar.
  • A principal fonte de mercúrio (na forma de vapor de mercúrio) na atmosfera é o desgaste natural da crosta terrestre.
O mercúrio metálico, na sua forma volátil, está presente na atmosfera e na água de beber e aqui os seus níveis são tão baixos que a exposição humana é negligenciável. Desta forma, as duas principais vias de exposição humana por inalação são a ocupacional (essencialmente a exposição crônica) e através de amálgamas dentários.
  • O amálgama dentário, cada vez menos usado, é constituída por uma mistura de metais geralmente nas proporções de 50% de mercúrio metálico, 35% de prata, 9% estanho, 6% de cobre e vestígios de zinco. Deste modo, é inserida nos dentes para cobrir os espaços vazios resultantes de cáries e adquire uma estrutura sólida em 30 minutos. 
Neste caso, a exposição ao mercúrio deve-se à libertação de pequenas partículas da amálgama por processos vulgares como a corrosão, a mastigação e a fragmentação. Esse mercúrio vai ser então inalado como vapor de mercúrio ou deglutido dissolvido na saliva. Contudo, não foi provado qualquer efeito adverso para a saúde que provenha das amálgamas, encontrando-se apenas casos raros de alergia.
  • Como fontes antropogênicas encontramos geradores de eletricidade a carvão, ETARs, refinarias, fábricas de adubos, lâmpadas de vapor de mercúrio, pilhas e extração do ouro. Por outro lado, cerca de 2000 a 3000 toneladas são libertadas anualmente para a atmosfera devido a atividades humanas, onde os incineradores de resíduos hospitalares e urbanos contribuem com cerca de 50% das emissões de mercúrio total para o ar.
Certos rituais religiosos e étnicos em que se usam o mercúrio líquido também podem levar à libertação de vapor de mercúrio.

Precauções:
  • O mercúrio é transportado no estado líquido, código do A.D.R.: 8,66,c. Deve ser armazenado em locais frios, secos, bem ventilados, protegido da radiação solar e de fontes de calor e ignição. Deve estar fora do contato de ácido nítrico concentrado, acetileno, amoníaco e cloro. 
Deve ser guardado em recipientes resistentes a corrosão e fechados hermeticamente. Pode ser armazenado em recipientes de aço inoxidável, plásticos, vidro e porcelana. Deve ser evitado armazená-lo em recipientes de chumbo, alumínio, cobre, estanho e zinco.
  • O mercúrio armazenado deve estar etiquetado com as frases R: R 23 ("Tóxico por inalação") e R 33 ("Perigo de efeitos acumulativos"). Também deve conter as frases S: S 1/2 ("Conserve sob chave e manter fora do alcance de crianças"), S 7("Manter o recipiente bem lacrado") e S 45 ("Em caso de acidente ou mal-estar, chame imediatamente o médico (se possível mostre-lhe a etiqueta)").
Em caso de acidente, os primeiros socorros são: 
  • Inalação: transladar a vítima para o ar fresco. Buscar auxílio médico. 
  • Contato com a pele. Retirar a roupa contaminada. Lavar a área afetada com água e sabão. Buscar auxílio médico. 
  • Contato com os olhos: Lavar imediatamente os olhos com água. Buscar auxílio médico. 
  • Ingestão: Enxaguar a boca com água. Buscar auxílio médico.
Tratamento:
Se necessita de ajuda, consulte um profissional de saúde. As informações aqui contidas possuem carácter puramente acadêmico.
  • Os agentes quelantes são usados farmacologicamente no tratamento de toxicidade com metais pesados. Os quelantes são moléculas que se ligam fortemente numa estrutura em anel aos metais. 
Um bom quelante clínico deve ter baixa toxicidade, ligar-se preferencialmente aos metais pesados com uma grande constante de estabilidade e ter uma taxa de excreção mais elevada do que os ligados endógenos, assim favorecendo a rápida eliminação do metal tóxico.
  • DMPS e DMSA são agentes quelantes ditiol usados no tratamento de toxicidade de mercúrio. O DMPS não está aprovado pelo FDA para qualquer uso clínico. Contudo está a ser utilizado para tratar a toxicidade provocada pelo mercúrio. 
  • O DMSA está aprovado para uso pediátrico, no tratamento de toxicidade por chumbo.
DMPS - 2,3-dimercaptopropanossulfato de sódio:
  • O DMPS foi aprovado como fármaco pela União Soviética em 1958, mas não estava disponível no Ocidente até por volta de 1978. Este é um ditiol solúvel em água. Tem sido utilizado no tratamento de envenenamento por arsênio, chumbo, mercúrio e cádmio e também na doença de Wilson. Como formas de administração temos a forma oral e a intravenosa e, é bio transformado nos humanos em dissulfureto acíclico e cíclico.
Foi primeiramente assumido que o DMPS se ligava ao mercúrio na razão 1:1. No entanto, estudos de espectrometria de absorção de raio-X demonstraram que essa estrutura não era possível. Assim teriam de ser formadas estruturas mais complexas usando pelo menos duas moléculas de DMPS e dois átomos de mercúrio.

DMSA - ácido meso-2,3-dimercaptossuccínico:
  • O DMSA é administrado via oral, é rapidamente mas, incompletamente absorvido. Tem sido usado para quelatar, entre outros metais, o chumbo, arsênio, cádmio e o mercúrio. É extensivamente metabolizado, sendo excretado principalmente pela urina e em pequenas quantidades pela bílis e pulmões.
Mais de 95% do DMSA no sangue encontra-se ligado às proteínas (principalmente albumina) e mais de 90% deste excretado na urina está na forma de dissulfureto ligado à L-cisteína.
  • Tal como o DMPS, pensava-se que o DMSA se ligava na razão de 1:1 com o mercúrio. Todavia mais tarde descobriu-se que forma um complexo binuclear Hg2(DMSA)2 in vitro. O DMSA não quelata o mercúrio no cérebro.
Os efeitos adversos do DMSA incluem desordens gastrointestinais, rash cutâneo e sintomas gripais. Aconselha-se uma contagem de células sanguíneas completa durante a terapia, uma vez que tem sido descrita neutropenia média a moderada em alguns pacientes. 
  • A função renal e hepática deve ser analisada antes de começar o tratamento. Contudo, considera-se o agente quelante DMPS menos tóxico.
Este fármaco tem um tempo de semi-vida de 3,2 horas e sabe-se que quelata os minerais essenciais cobre e zinco.

O mercúrio que corre dentro dos termômetros, por exemplo, não molha o vidro, 
nem qualquer tipo de papel, mas, se for jogado sobre uma superfície de ouro, 
a bolinha de mercúrio se desfaz, espalhando-se